O processo de desindustrialização no Brasil: causas, impactos e como reverter
Ao longo das últimas décadas, o setor industrial brasileiro passou por transformações significativas em sua posição na economia mundial.
Desde a década de 1990, entretanto, o Brasil tem sofrido um preocupante processo de desindustrialização, que se agravou severamente nos últimos dez anos. A indústria de transformação, que em 1985 representava 36% do PIB, terminou o ano de 2022 com apenas 11,5% de participação na produção nacional. Mais grave ainda foi a queda da participação da indústria brasileira na produção mundial.
Em 1995, nossa indústria manufatureira representava 2,77% da produção mundial, percentual que hoje é de apenas 1,28% – ou seja, praticamente a metade –, como mostra recente estudo elaborado pela CNI.
Como resultado, o setor industrial brasileiro perdeu competitividade em relação a outros países, como China, Índia e Coreia do Sul, que investiram em modernização e renovação de seus parques industriais.
A idade média do parque fabril brasileiro é relativamente antiga em comparação com outros países desenvolvidos e emergentes. Segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a idade média das máquinas e equipamentos utilizados na indústria brasileira é de cerca de 17 anos.
Consequências da desindustrialização
A desindustrialização é danosa para toda a economia brasileira, sobretudo devido à capacidade que o setor tem de multiplicar riquezas. A cada R$ 1,00 produzido na indústria de transformação, são gerados R$ 2,43 na economia como um todo. A título de comparação, na agricultura são gerados R$ 1,75 e nos setores de comércio e serviços, R$ 1,49. O setor industrial tem a capacidade de puxar o crescimento dos demais setores por possuir cadeias produtivas longas e ser o grande indutor de inovações da economia. Mesmo a revolução de telecomunicações, que afetou profundamente o setor de serviços, dependeu da criação de produtos industriais, como smartphones, sensores, torres de transmissão, entre outros.
A alta produtividade e a produção em larga escala da agropecuária nacional, deve-se também, em grande medida, aos insumos fornecidos pela indústria, tais como ferramentas, máquinas e equipamentos com grande conteúdo tecnológico; rações para animais; sementes, fertilizantes e defensivos.
Principais causas da desindustrialização no Brasil
Como mencionado acima, a desindustrialização no Brasil é um processo que começou na década de 1980 e tem se intensificado nas últimas décadas.
As causas são complexas e multifacetadas e incluem:
Infraestrutura
As empresas dependem de uma infraestrutura adequada para operar com eficiência e competitividade, como sistemas de transporte, energia, comunicação, entre outros. No entanto, quando esses sistemas estão defasados, ineficientes ou mal conservados, as empresas enfrentam atrasos, custos adicionais e redução da qualidade do serviço, o que compromete sua competitividade e produtividade.
Por exemplo, empresas que dependem do transporte de mercadorias enfrentam problemas de congestionamento, falta de investimento em rodovias, ferrovias e portos, além de limitações nos sistemas de armazenamento e distribuição. Isso leva a atrasos nas entregas, redução da qualidade dos produtos e aumento dos custos, o que torna as empresas menos competitivas em relação a empresas de outros países.
Da mesma forma, a falta de investimentos em infraestrutura energética pode levar a cortes frequentes de energia elétrica, o que pode interromper as operações das empresas e prejudicar sua produção.
Custo Brasil
O “custo Brasil” é uma expressão usada para descrever o conjunto de fatores que tornam os custos de produção no Brasil mais elevados em relação a outros países, o que afeta negativamente a competitividade das empresas e pode levar à desindustrialização.
Entre os fatores que contribuem para o “custo Brasil” estão: alta carga tributária, burocracia excessiva, juros elevados, infraestrutura precária, falta de investimento em educação e tecnologia, entre outros.
Esses fatores elevam os custos das empresas, tornando-as menos competitivas em relação a empresas de outros países, o que pode levar à redução da produção industrial e até mesmo à desindustrialização.
Por exemplo, a alta carga tributária no Brasil aumenta o preço dos produtos, tornando-os menos competitivos no mercado globalizado. A burocracia excessiva e a falta de agilidade nos processos administrativos também aumentam os custos das empresas, tornando-as menos competitivas. Além disso, os juros elevados dificultam o acesso ao crédito e aumentam os custos financeiros das empresas.
Taxa de Juros
A taxa de juros no Brasil é uma das mais altas do mundo. Isso torna o investimento em novas tecnologias e equipamentos mais caro, reduzindo a competitividade da indústria nacional. Além disso, a alta taxa de juros incentiva a especulação financeira em detrimento do investimento produtivo.
Falta de Investimento em Pesquisa e Desenvolvimento
O investimento em inovação é fundamental para a competitividade da indústria, pois permite a criação de produtos mais avançados e a redução de custos de produção. A falta de investimento em pesquisa e desenvolvimento reduz a capacidade da indústria nacional de competir com produtos mais avançados produzidos em outros países.
Além disso, o Brasil também tem apresentado um desempenho ruim em rankings globais de inovação e competitividade. Segundo o Índice Global de Inovação 2021, elaborado pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual, o Brasil ocupa apenas a 62ª posição entre os 132 países avaliados. Já no Índice Global de Competitividade 2021, elaborado pelo Fórum Econômico Mundial, o Brasil ocupa a 71ª posição entre 141 países avaliados.
Mão de obra
Com a globalização, as empresas brasileiras passaram a enfrentar uma concorrência cada vez maior de empresas estrangeiras, muitas vezes com tecnologia mais avançada e mão de obra mais qualificada. Para competir nesse cenário, é necessário que as empresas brasileiras também invistam em tecnologia e qualificação da mão de obra, para produzir bens de alta qualidade a preços competitivos.
No entanto, muitas empresas brasileiras não investem o suficiente em qualificação da mão de obra, o que leva a uma baixa produtividade e qualidade dos produtos, tornando-se menos atraentes para os consumidores. Além disso, a falta de qualificação dificulta a adoção de novas tecnologias e métodos de produção, limitando a capacidade de inovação das empresas.
Sete passos para reverter o processo de desindutrialização no Brasil
O processo de industrialização é fundamental para o desenvolvimento econômico de um país, porém, há desafios a serem enfrentados. Algumas soluções que poderiam contribuir para reverter a desindustrialização no Brasil são:
- Reforma tributária: A implementação de uma reforma tributária simplificada e justa é essencial para a competitividade das empresas. Um sistema tributário complexo, com impostos elevados e inúmeras obrigações fiscais, dificulta o crescimento da indústria. Além disso, a reforma tributária poderia estimular a inovação e a produtividade, pois a redução dos impostos pode significar mais recursos para investir em tecnologias avançadas e capacitação da mão de obra.
- Investimento em tecnologias como a indústria 4.0: A adoção de tecnologias de ponta pode tornar a indústria mais competitiva e produtiva, além de aumentar a qualidade dos produtos e serviços oferecidos. A indústria 4.0, que envolve automação, robótica, inteligência artificial e internet das coisas, pode ser uma boa oportunidade para a indústria brasileira se modernizar.
- Capacitação da mão de obra: A capacitação da mão de obra é fundamental para a competitividade da indústria. Investir em treinamentos, programas de aprendizagem e incentivos para o desenvolvimento de habilidades técnicas pode ajudar a qualificar a força de trabalho brasileira.
- Parcerias com startups: As startups têm se destacado como um importante agente de inovação e transformação digital. A indústria pode se beneficiar da colaboração com startups para aprimorar processos, criar novos produtos e serviços, além de desenvolver soluções inovadoras para os desafios do setor.
- Ambiente de negócios seguro para atrair investimentos externos: O Brasil precisa melhorar o seu ambiente de negócios para atrair investimentos estrangeiros. Para isso, é necessário estabilidade jurídica, segurança institucional, transparência e previsibilidade nas regras do jogo.
- Linhas de crédito: As empresas precisam de acesso a linhas de crédito para investir em novas tecnologias, equipamentos e capacitação da mão de obra. Por isso, é importante que o governo e as instituições financeiras criem programas de financiamento que atendam às necessidades das empresas.
- Ambiente político: Por fim, é fundamental que o ambiente político seja favorável ao desenvolvimento da indústria. Políticas públicas claras e consistentes, com metas definidas e ações concretas para atingi-las, podem estimular a indústria brasileira a se desenvolver e se tornar mais competitiva.
Conclusão
A desindustrialização é um problema que afeta a economia brasileira há décadas, mas é possível reverter essa tendência com a implementação de políticas públicas adequadas e investimento em tecnologia e inovação.
A indústria 4.0 pode ser uma importante aliada na retomada da competitividade da indústria brasileira, permitindo a produção de produtos mais avançados, personalizados e sustentáveis.
É necessário que o governo, as empresas e as instituições de pesquisa e ensino trabalhem em conjunto para implementar as soluções necessárias e tornar a indústria brasileira mais competitiva em nível global.
A adoção da indústria 4.0 pode ser um importante passo nesse sentido, mas é preciso investir em educação e em políticas públicas adequadas para garantir que a tecnologia esteja acessível a todas as empresas, independentemente de seu porte ou setor de atuação.
A indústria brasileira tem potencial para ser uma das mais competitivas do mundo, mas é preciso trabalhar para superar os desafios e aproveitar as oportunidades que surgem com a transformação digital da indústria.
Com o investimento adequado e a implementação de políticas públicas eficazes, é possível tornar o Brasil um protagonista no cenário mundial da indústria 4.0.